terça-feira, 25 de dezembro de 2012

A considerar

Não paro de andar porque, se assim faço, a vontade de voltar é maior. Não paro porque quando parei antes o coração fugiu da minha razão e assim, virei descompasso. Não dá para parar quando seu objetivo é chegar. A figura no entanto muda quando esse desejado alvo começa a transmutar - e com ele vai minha vontade em chegar.

Teimo em sonhar com algo mais duradouro, algo que comece em lentidão mas, por isso mesmo, tenha tempo de crescer. Queimei etapas demais antes, e elas agora fazem falta. Queimei minhas vontades também, mas não importa, sobrevivem até ao fogo do inferno, e por isso resistiram e me assombram sempre que minha guarda é baixa. Como viver eternamente sob minha armada? Isso não mais me serve de nada.

E agora sinto falta de ver amizade virar amor. Sinto falta de ter em mim a inocência de alguém que se conquistou. Eu mais conquistei, eu mais invadi, eu pouco deixei de mim para que viesse você e me levasse daqui. É estranho perceber o quanto quero algo que ninguém pôde me dar... Nem sei se tive a coragem de esperar, esperar pelo tempo certo de encontrar. Mas quando viria? Quando virá?

Por isso andei demais, e fui longe o bastante para não saber como voltar. Por medo de dar tempo ao tempo, de entender o momento, de amadurecer minhas entranhas para ser terra viva, terra de florescer e frutificar. Andei porque tinha medo de voltar...

Mas o que mesmo há de tão tenebroso em voltar?



"With the birds I'll share this lonely view"

sábado, 15 de dezembro de 2012

Epitáfio do Fim do Mundo

Se o mundo acabar, você tem coisas a deixar?

"Epitáfio"

Se o mundo acabar em alguns dias,
Quero estar com você
Poder lhe beijar até o segundo
Que antecede morrer
Segurar sua mão quando a onda vier
E deixar que nos leve,
Mas juntos!

Isso me deixa seguro

Se o mundo acabar em poucos dias,
Quero dizer que isso não nos limitará
Na verdade,
Nada pode limitar
O que nasceu para resistir
A tudo o que machucar.
E resiste,
Como raiz,
Não como flor

Temos nossas flores,
Mas elas não sobreviverão ao fim,
Meu amor

Por isso que o mundo acabe,
Que meus dias renunciem à existência,
Mas que seja esta minha carta de rescisão
Nela estão meus sentimentos,
Prescindindo as palavras,
Os atos,
Prescindindo a razão
Se alguém lê-la,
Que saiba como
Em tudo
Fui um homem apaixonado

E amei

Amei estar a seu lado,
Meu amado


sábado, 8 de dezembro de 2012

MDNA Tour: a minha jornada.

Nota: este texto funciona como a parte II do “MDNA Tour: a jornada de Madonna”, publicado dias atrás. O primeiro descreve o show como um todo, e neste me atento a coisas mais específicas, então recomendo que se gostar de um, leia o outro também ;)



Há um tempo, escrevi um texto sobre como via a MDNA Tour, mas na perspectiva de alguém que não havia experimentado o show de verdade, ao vivo. Nesses últimos dias, porém, tive a felicidade sem tamanho de assistir a dois dos concertos apresentados no Brasil, Rio e SP (dia 04). Antes de explicar o que de novo floresceu em meus pensamentos após acompanhar de perto a jornada de Madonna, gostaria de falar sobre outro aspecto dessa viagem para mim: meus amigos.

Tive a chance de encontrar pessoas com quem interajo pela internet há anos (alguns desde 2006), e só posso dizer que em tudo superaram minhas expectativas. Me senti acolhido e dentro de uma nova casa, moradia essa que já vinha sendo construída há muito tempo. A todos vocês, com suas palavras, personalidades, o bom humor e sorrisos tão sinceros, meu mais doce “obrigado” (dedico tudo isso também a meu namorado).

Retomando o foco do texto, queria lhes perguntar algo: o que É Madonna? Não sei se pensam assim, mas só estando na presença dela, vendo duas horas de show virarem 15 minutos de êxtase e percebendo o quanto tudo, e digo tudo mesmo, em seu show é bem pensado e remete a uma mensagem meio profética, meio poética, é que tive dimensão de como ela é uma artista (ou entertainer, se preferirem) sem tamanho. Cada canção está no lugar apropriado e cria uma narrativa contada de forma simples, mas enriquecida exatamente nos detalhes. São tantas pequenas coisas que você sente a necessidade de assistir mais e mais shows, para captar de diferentes perspectivas toda a riqueza do espetáculo. E mesmo que falar coisas assim lhes dê a impressão de que estamos diante de um show frio, reitero que não, a MDNA Tour está longe de parecer somente calculista: a emoção explode durante toda a performance, fazendo chorar, sorrir, criando um movimento de resposta mútua entre quem está no palco e quem está no público. É embasbacante.

E falando dos blocos, creio que seguem mais ou menos os apontamentos que fiz anteriormente; agora, no entanto, tenho novas coisas para dizer sobre cada um, e farei por partes.

TRANSGRESSÃO: este momento do show deixou muita gente próxima a mim surpresa por ser tão soturno e macabro. É sem dúvida uma das melhores apresentações de Madonna, reforçando um lado quase esquecido em performances recentes da cantora: a teatralidade. Uma das coisas que mais me chamou atenção foi que, durante Papa Don't Preach, M canta amparada por uma cruz imponente (no telão), o que reforça que ali o Pai era um pouco mais celestial que o Sr Silvio Ciccone... E Hung Up, nossa, após acompanhar as imagens de background consegui entender de fato a performance! Nele, vemos takes retratando magia negra e feitiçaria pesada, envolvendo vudus, rituais tribais, linhas da vida sendo traçadas e redesenhadas e até o crânio de um bode sendo manejado por um feiticeiro. Dá para entender que “Hung Up” está levando ao pé da letra a sua tradução “presa”, “ligada”, no sentido da personagem estar sob uma forte amarração, seja pela devoção cega a um culto organizado, ou pela dependência obsessiva por alguém amado. Passar pela slackline é uma prova de fogo para sua liberdade, e ao conseguir o feito, finalmente M pode cantar I Don't Give A.

Esta canção, inclusive, me deixou boquiaberto por dois detalhes de sua performance, no começo e no fim: quando Madonna se direciona ao centro da plataforma para tocar sua guitarra, aqueles monstros antropozoomórficos que a carregaram em Papa... agora a seguem como animais de estimação, o que me remete novamente à ideia de que ali ela era senhora de seus temores. Já sobre o fim, na verdade foi um momento que me recordo de ter acontecido somente em SP: ao que parece, M mostrou o dedo do meio para a cruz! Foi uma blasfêmia? Talvez. Mas o que ela significa? Que toda a opressão e imponência que o cristianismo atual empurra goela abaixo de seus seguidores é algo que ela não aceitaria mais para si. É incrível!



PROFECIA: chamar esta sequência assim remete mais ao intervalo que a abre (Best Friend/Heartbeat), mas deve ter a ver também com a catarse de Open Your Heart/Sagarra jo !, bem como os discursos que a cantora costuma fazer após esta canção. É como se Madonna estivesse “profetizando” sobre suas noções acerca da liberdade, igualdade e unidade. Em SP mesmo, M usou o significado da expressão “Sagarra jo !” para tal; segundo a cantora, isso quer dizer “amassar maçãs”, porém no sentido da apresentação, as maçãs são os preconceitos, a miséria, ignorância e falta de empatia. Inclusive, uma das coisas que podemos perceber na interação entre a cantora e o público através das palavras é que ela é uma ótima entusiasta. Ainda que todos estejam lá para vê­-la, Madge é bastante competente em ater a atenção de sua plateia, especialmente quando cita palavras em português (ela adora aprender palavrões, por sinal rs) ou pede que cantem com ela musiquinhas bobas, como a “sagarra jo, São Paulô!”.

Neste bloco, quem também brilha, e muito, são os cantores e instrumentistas do trio Kalakan. Com vozes limpas, super afinadas e extremamente comoventes, cada uma de suas participações no espetáculo é bem vinda e só acrescenta. Desde a primeira vez que ouvi o audio de Masterpiece ao vivo, era apaixonado pelo instante em que eles se juntam a Madonna para concluir a canção, e acabei chorando quando os ouvi entoando, “And I'm right by your side...” *suspiros*

MASCULINO/FEMININO: além de um lustre imenso servindo de ambientação para Candy Shop – Human Nature, gostaria de falar sobre minhas novas impressões assistindo ao vivo Like a Virgin/Love Spent. A primeira das duas músicas não é mais cantada em tom de lamento – pelo contrário! Deixando toda carga dramática da performance para a segunda, LaV assume um sabor despojado, bem humorado e muito sensual. Todos enlouqueceram com a tatuagem de PERIGUETE no Rio, bem como com a interação direta que o momento intimista propiciou; eu mesmo fiquei babando por Madonna, e rindo muito com o “you're making the biggest mistake of your life”, dito ao fã que recebeu a maçã mordida por ela durante a música. Casando as duas canções, creio agora que representam melhor a repressão sofrida por Madonna em ser quem é (algo que dialoga com sua idade, ultimamente): “goxtosa”, da forma mais provocadora que essa palavra possa soar.

É muito bom perceber também que nessa retomada de si mesma, M decidiu voltar mais uma vez sua atenção ao público LGBT. Ainda que ela nunca tenha deixado de ser um ícone gay, é patente como na MDNA Tour veste a camisa da causa, seja na presença destacada do dançarino oriental andrógino, na brincadeira com padrões de gênero ou, de forma mais política, no vídeo de Nobody Knows Me, mostrando fotos de sete adolescentes gays que se suicidaram por terem sofrido bullying, em ambientes de ensino. Há quem ainda diga se tratar de golpe de marketing, mas normalmente quem acredita nisso vê Madonna como somente uma marketeira; é uma posição que considero bem equivocada, ainda mais depois dos shows assistidos, mas não é o tipo de coisa que quero discutir aqui e agora... Enfim, o último bloco.



REDENÇÃO: divertido, colorido, impressivo visualmente e simplesmente catártico. Não tenho muito o que acrescentar sobre as coisas que já disse antes, mas gostaria de pontuar que, sem sombra de dúvida, Like a Prayer é o momento do show! Há nessa canção uma entrega sem tamanho tanto de Madonna como do público, de modo a criar um ambiente de comunhão intensa entre todos os presentes. Em SP, assisti ao show da arquibancada, e até agora é difícil descrever a sensação de ver um estádio com 58 mil pessoas batendo palmas em conjunto – É como fazer parte da totalidade, e sem dúvida é isso que M quer que sintamos cantando com ela um de seus maiores clássicos. Devo pontuar também que é bem emocionante vê­la dançando com a bandeira brasileira (coisa que ela não faz com a bandeira de todo lugar que passa); isso me faz pensar em como criticamos nosso país e às vezes desejamos não viver aqui, mas de alguma forma somos ligados a ele – Ok, parei com o nacionalismo fajuto.

Um outro ponto da performance diz respeito ao coral formado pelos dançarinos e equipe de Madonna. O perfil do twitter @poserdemadonna disse que ele representava a “União dos Povos”, e a julgar pelo caráter multiétnico de seus integrantes, é uma noção que faz todo sentido e engrandece ainda mais a mensagem da cantora através de sua música.

Com esta postagem, fecho o meu ano “madônnico”, e faço isso com chave de ouro, já que felicidade é pouco perto do que senti em presenciar a completude dessa mulher de 54 anos, pondo um espetáculo de pé como ninguém. E vê­-la ali, sendo ao mesmo tempo tão forte e tão vulnerável, fez­-me lembrar do poeminha escrito e recitado por ela no I'm Going To Tell You a Secret, em que se refere ao palco como uma gaiola:

I have a cage
It's called the stage
When I'm let out
I run about
And sing and dance and sweat and yell
I have so many tales to tell
I like to push things to the edge
And inch my way along the ledge
I feel like God, I feel like shit
The paradox, an even split
It's just a job, I always say
I should be grateful everyday
Sometimes I think I just can't do it
But I persist and I get through it
And I console myself each night
At least my cage is filled with light.

“Ao menos minha gaiola é repleta de luz”.

E ela está certa.
De seu palco, mesmo nos momentos mais escuros, emana luz.

É espiritual.



PS: as fotos dessa postagem são minhas, de Nayara Guimarães e de Rodrigo Oliveira.

sábado, 24 de novembro de 2012

MDNA Tour: a jornada de Madonna.

NOTA: esta review do show é cheia de spoilers, mas cheia mesmo, então não leia se quiser manter a surpresa!



Queria deixar para falar da MDNA Tour aqui no blog após assistir ao show, mas como provavelmente eu terei um relato mais emocional do que descritivo nessas condições, decidi discorrer sobre o que já conheço da apresentação, através do que li, assisti e ouvi. Bastante coisa, por sinal. Acho que estou fazendo isso também para acalmar um pouco a ansiedade, já que agora faltam menos de 10 dias para eu finalmente estar de frente à cantora, que me acompanha há mais de 10 anos. Então, vamos lá.

Esta é a 9ª turnê de Madonna, dá apoio promocional a seu 12ª disco de estúdio, MDNA, mas serve também de comemoração às 3 décadas de carreira da Rainha do Pop. Não à toa, o disco em si soa como uma retrospectiva de muitos dos elementos que Madge explorou em sua vida artística, indo desde a iconografia religiosa até as influências orientais. Acontece que as diferentes temáticas da tour também nos remetem a estes ícones, numa viagem que, de forma grosseira, resume-se no caminho de uma alma da completa escuridão até a iluminação. É dessa forma que vemos uma garota enlouquecida alcançar paz e, enfim, ter a chance de celebração! Antes de me aprofundar nisso, porém, falarei um pouco sobre a tecnologia envolvida em sua produção.

O imenso palco da MDNA Tour é amparado por três grandes telões, nos quais surgem as ilustrações de cada performance. A ambientação é dada também por 36 blocos de LED, projetando-se do chão e formando desde níveis no palco até estruturas mais complexas, como os "três ônibus" de I'm A Sinner e as "cabines de DJ" em Celebration. Tal amparo tecnológico tem sido, nas turnês recentes de Madonna, uma maneira extremamente bem sucedida de substituir o excesso de elementos cenográficos, dando assim uma aparência mais limpa ao espaço. Isso no entanto não quer dizer que eles não existam, já que em momentos mais teatrais da apresentação acabam aparecendo, a exemplo do quarto de motel em Gang Bang. Para mim, aliar tecnologia a seus espetáculos é sempre um lado positivo das performances de Madge. No entanto, meu objetivo maior nesse texto é me debruçar sobre os temas da turnê, e para isso vou começar do começo...



O show se divide em quatro blocos temáticos, e no inicial, chamado de "Transgressão", a cantora explora exatamente o lado mais obscuro das emoções, amparando-se numa diversidade de referências a demônios íntimos que vivem em cada um de nós. O primeiro desses demônios, bem característico da própria Madonna, é a religião como ferramenta de opressão e ódio. O show é aberto por cânticos de caráter litúrgico, entoados pelo trio de música basca Kalakan, enquanto um imenso turíbulo é erguido e movimentado como um pêndulo no palco, pela ação de "monges" vestidos em mantos escarlates. Surgem também quatro dançarinos com máscaras de gárgulas, contorcendo-se em movimentos bizarros, até finalmente ouvirmos a voz de Madonna, orando o "Act of Contrition". É aí que uma estrutura dourada mostra-se entre as duas metades do telão principal, e nela vemos uma noiva toda de preto, ajoelhada e portando consigo uma metralhadora. Ao quebrar o vidro daquele altar com a arma, M mostra-se ao público pela primeira vez e começa Girl Gone Wild, numa coreografia sufocante ao lado daqueles monges, agora despidos e usando somente uma calça justa e salto alto. O cume desta performance é sem dúvida a ponte que leva ao refrão final, na qual os efeitos visuais combinam-se com os passos de dança e mostram uma Madonna caindo dos céus... De longe, um dos melhores momentos!

Passada a primeira música, é começada Revolver, e dessa vez são as dançarinas que surgem com armas pesadas para, junto a Madonna, formarem a quadrilha das Beautiful Killers. Um dos primeiros contrastes que chama atenção nesse momento é a suposta inversão de papéis entre as duas canções: enquanto em GGW, são os dançarinos que usam saltos e se expressam de forma afetada, nessa música quem assume um papel agressivo e voraz são mulheres. Enfim, a temática masculino/feminino volta a se fazer presente na terceira parte, e lá tentarei explicar em que ele se encaixa no espetáculo. Mas, dando continuidade ao bloco, chegamos a seu ápice na terceira música do show, quando Madge pega sua arma, e dentro de um quarto de motel ("paradise motel", por sinal), começa sua saga de assassinatos até conseguir matar seu maior desafeto, um antigo romance; isso é Gang Bang. Com sua coreografia milimétrica, é um dos momentos mais explosivos e intensos do show, e até da carreira de Madonna em si. A garota pirada de GGW sai matando um a um seus agressores, até começar uma pulsante luta corporal com seu último alvo (durante o dubstep da canção) e finalmente conseguir exterminá-lo.

A questão é que ainda durante esta música, a personagem demonstra sinais de insanidade, até surgir o arrependimento e junto a ele, todos os demônios que ainda a perseguem; começa Papa Don't Preach. Mudando de forma contundente o sentido da canção, esta agora soa como um discurso de alguém saturado e que percebe ter feito a escolha errada. E à medida que canta, aproximam-se de Madonna os tais demônios, dotados de máscaras animais e prontos para capturá-la e levá-la ao limbo... Hung Up, numa versão mais sombria e completamente subvertida, entra em cena para representar tal situação. No entanto, esta música ganha uma ressalva especial: ela funciona como um turning point, usando-se da corda bamba (slackline) como mais uma metáfora para se referir ao delicado limite entre o céu e o inferno. Uma Madonna até então acorrentada é levada a atravessar tais cordas, enquanto ressoam os versos "you'll be sorry" e "please, forgive me". Ao terminar o percurso, a iluminação do palco, que começa vermelha, torna-se azulada sobre a própria cantora, representando que ali ela se tornou senhora de tudo o que lhe afligia. Não à toa, ela usa os dançarinos mascarados como uma escada, domando-os e finalmente podendo dizer, de forma categórica, que ela não dá a mínima. I don't give A!



Cantando de forma agressiva que "faz 10 coisas ao mesmo tempo, e se você tem problema com isso, eu não dou a mínima", o bloco é concluído com um rompante de autoafirmação, reiterado pelo já clássico verso de Nicki Minaj: "There's Only One Queen, and that's Madonna, Bitch!". Nesse momento, Madonna é elevada ao ponto mais alto do palco sob a luz de uma cruz imensa, onde se lê MDNA invés de INRI, estendendo sua mão com avidez, como se tentasse alcançar de fato o que está acima. É aí que chegamos num momento emblemático: a estrutura da catedral apresentada durante o começo do bloco volta a aparecer, e num último instante, quebra-se em pedaços que se desmancham de uma única vez. O primeiro grande demônio que vem e vai pelo show é domado: a opressão religiosa.

Passado esse momento vigoroso, somos levados a um intervalo, num mash up das canções Heartbeat/Best Friend. Este abre o segundo bloco da tour, "Profecia". Enquanto alguns dos dançarinos fazem movimentos semelhantes aos dos gárgulas que abrem o bloco anterior, os telões exibem imagens de um cortejo fúnebre, passando por lápides onde se pode ler palavras como "Fé", "Infinito", e a citação "What Man Doth Foolishly Call Death" ("O que fez o homem tolamente chama-se morte"). Mesmo passando uma sensação funesta, ao cantar "it's so sad that it had to end", a mensagem deixada no telão é "Love Is Above All" - como um epitáfio, seria a mensagem que Madonna através de seu trabalho quis deixar; emendamos dessa forma com um hino ao amor próprio: Express Yourself.

Usando figurino de Majorette (para o qual muita gente torceu o nariz), ela surge novamente do meio das telas, onde agora são apresentadas imagens que misturam elementos de pop art, quadrinhos e anúncios antigos dos EUA. A mensagem por trás desses elementos é um acompanhamento literal da letra da música, mas vale salientar o momento em que três casais desenhados (um de lésbicas, outro de gay e o terceiro heterossexual) aparecem se beijando. A performance é selada com o polêmico acréscimo de Born This Way ao final, cantada nota a nota sobre a base de Express Yourself, para depois ser emendada com um abusado "she's not me, she's not me"... Essa é a deixa perfeita para a introdução de Give Me All Your Luvin', canção que fala sobre Madonna ainda ser a maioral. No show, GMAYL ganhou uma versão vigorosa, com direito a tamboristas pelos ares e uma coreografia de líder de torcida de deixar qualquer um de queixo caído. Essas duas músicas são seguidas de um pequeno intervalo, no qual ela troca de roupa novamente e aparece tocando em sua guitarra Turn Up The Radio.



Passada Turn Up The Radio, chegamos a um dos instantes mais inventivos do concerto, com a participação mais que pronunciada do trio Kalakan. Usando uma base de música basca, Open Your Heart é apresentada numa versão acústica e cativante. Os cantores do Kalakan são finalmente apresentados ao público, fazendo vocais base e tocando instrumentos percussivos que ditam todo o charme da nova versão. A performance é selada com uma música do próprio trio, "Sagarra Jo !", criando um momento de êxtase semelhante a La Isla Bonita de 2008, na Sticky and Sweet Tour. Com a apresentação concluída, Madonna aproveita para recuperar o fôlego e conversar com o público sobre qualquer assunto corrente, e foi justo nessas conversas que ela levantou questões polêmicas, como a prisão das Pussy Riot, a lei anti-propaganda gay de São Petersburgo, e as eleições norteamericanas. Mesmo tendo incluído "minicanções" em alguns dos shows (Holiday, Everybody, Give It 2 Me com PSY), normalmente o discurso é seguido por Masterpiece, também amparada pelos vocais do Kalakan.

Após cantar o último "Nothing's Indestructible", Madonna sai do palco e começa o segundo grande intervalo do show, numa versão extremamente provocante para Justify My Love. Primeiro ouvimos temas circenses e vemos palhaços segurando câmeras e correndo atrás da cantora; ela então consegue se trancar num salão luxuoso e lá mostra sua sensualidade ao som da nova versão da canção (produzida aqui por William Orbit). Bem dizer, esse vídeo tem por objetivo tocar no segundo demônio que a perseguiu, especialmente este ano: o ageism, preconceito com pessoas mais velhas. Ao se mostrar completamente sexual com 54 anos de idade, Madonna responde a todos os que a criticam através de sua imagem, não dando muita brecha para quem a acha muito velha para fazer o que faz. Justify My Love também abre caminho para o 3º bloco do show, batizado "Masculino/Feminino", e que se constrói, à semelhança da dualidade Girl Gone Wild/Revolver, no questionamento de quais papéis são femininos e masculinos, especialmente em termos estéticos.

Começamos aqui com Vogue, numa versão parecida com a do Super Bowl, mas apresentada com um novo apelo visual: Jean Paul Gautier foi convidado a reinventar o corselet usado pela cantora na Blond Ambition Tour, tornando-o assim numa armação metálica e dotada dos icônicos seios em cone. Os dançarinos, por sua vez, usam peças "trocadas" ou de caráter andrógino, fazendo alusão ao tema geral da 3ª parte, seguindo no entanto a coreografia apresentada no Half Time Show do início do ano. Passada Vogue, porém, temos um momento de grande surpresa para todos os fãs: Candy Shop. A nova versão da música, ambientada agora numa atmosfera mais jazz e sensual que a original, é perfeita para o cenário cabaré que se forma no palco. Ainda há espaço para uma coreografia bem saliente de Madonna e seu namorado (e dançarino da tour) Brahim Zaibat, quando no meio da música há um rompante da emblemática Erotica ("Put your hands all over my body"...). Após abusar de seu lado mais sexy, chega a hora de falar diretamente a quem a critica por ainda agir assim, o que nos leva a uma performance ainda mais contundente, com direito a strip tease...



Em Human Nature, Madonna canta rodeada de espelhos sobre o escrutínio que até hoje vê em torno de seu nome, até começar a se despir, do meio para o fim da música. Este é um momento importante do concerto, por dois motivos. O primeiro deles é que, de costas nuas, a cantora expunha uma tatuagem que virou marca registrada desta turnê. A mais utilizada era o dizer "No Fear", porém, a depender de onde a tour passasse, M também fazia diferentes homenagens. Foi o ocorrido com Obama, as Pussy Riot, e a garota paquistanesa Malala, vítima de um atentado do talibã por manter um blog no qual falava dos problemas educacionais de sua comunidade. O segundo motivo é que, após o strip tease, Madonna ficava completamente vulnerável e entregava uma reedição também despida e sutil de um de seus maiores hits, Like a Virgin.

Esta música é cantada em versão acústica, tendo como base a belíssima Evgeni's Waltz, composição de seu filme W.E., e assume um tom de lamento, como de um amor perdido, da lembrança de alguém que a fez se sentir como uma virgem novamente, mas que já não está mais a seu lado. Parece-me óbvio ter sido esta uma performance dedicada a seu ex-marido Guy Ritchie, havendo espaço nela para mais uma metáfora que reforça seu tom lamurioso: durante Human Nature, o telão mostra a imagem de um homem observando Madonna constantemente; ao final, esse homem "sai" do vídeo, e acaba aparecendo presencialmente para o clímax de Like a Virgin. É nesse instante que ela tem um espartilho preso à sua cintura, o qual é puxado pelo tal homem até deixá-la praticamente sufocada. Ele então solta as cordas do espartilho, deixando-a para trás, até ela sentar no banco do piano no qual a canção era tocada, para descer com ele à parte interna do palco. A ideia, possivelmente, é de que aquele relacionamento, mesmo tendo sido especial, acabava a sufocando, o que denota que seu fim talvez tenha sido o melhor.

É preciso reforçar que esta última apresentação sofreu no meio da tour uma grande mudança, com a inclusão de Love Spent para finalizá-la. A novidade deu um tom um pouco mais rancoroso ao ensejo, já que agora, invés de Madonna somente lamentar a perda do amado, demonstra ter percebido que ele tinha interesses um pouco diferentes do dela no relacionamento... Mesmo sendo mantido o sufocamento pelo espartilho, Like a Virgin/Love Spent torna-se sem dúvida o exorcismo do terceiro demônio: as mágoas de um amor mal resolvido. Tanto que ao final da canção, a cantora sai catando o dinheiro que estava jogado pelo chão para entregá-lo, de forma raivosa, à sua antiga paixão (nota: este dinheiro surgiu somente com a inclusão, e cabe muito bem no novo contexto).



Passados tantos exorcismos, é chegado o 4º e último bloco da tour, não à toa chamado de "Redenção". E ele é iniciado com o último vídeo de intervalo do show, o qual foi motivo de buzz na internet quando vazou em alta qualidade no youtube: Nobody Knows Me. É de praxe que em turnês de Madonna um dos intervalos tenha um tom mais político e de intensa crítica social, e nessa não foi diferente; para tal música, a cantora aparece primeiro de rosto limpo, e à medida que o vídeo transcorre, nele são incluídos recortes de outros rostos, símbolos diversos e imagens de conflitos e desastres espalhados pelo mundo. Foi inclusive desta gravação que surgiu a polêmica com a política francesa de extrema direita Marine Le Pen, uma vez que o rosto de Marine é colado no de Madonna, e pouco depois uma suástica (reconhecido símbolo nazista) aparecia em sua testa. Em suma, Nobody Knows Me é rica de significados, e abre caminho para I'm Addicted, a pulsante canção que retoma os trabalhos.

Interpretando algo como Joana D'Arc, Madonna traz na coreografia de I'm Addicted referências a artes marciais, num momento visualmente futurista e tematicamente ligado a elementos orientais. É a partir destes elementos inclusive que se segue a canção I'm A Sinner, reciclando a temática religiosa, mas num tocante mais espiritualista e lisérgico. Além dos três ônibus que se formam com os cubos de LED no palco, e que parecem estar em movimento quando contrastados às paisagens indianas apresentadas no background, há também de se notar que os gárgulas surgidos no início do espetáculo, antes de Girl Gone Wild, agora são monges hindus fazendo malabarismos corporais de Yoga. Ao final, surge um trecho de Cyberraga, música em sânscrito gravada para o disco Music e cantada aqui junto ao trio Kalakan. É este o momento em que a redenção toma forma de verdade, e como que vindo de um transe espiritual causado pelos cânticos, floresce o ápice da apresentação: Like A Prayer.

Numa versão semelhante à original, Like a Prayer é anunciada pelos sinos que abrem o concerto, e tem como novidade a presença concreta de um coral no palco (formado pelos dançarinos e algumas das pessoas envolvidas no backstage). Madonna se entrega por completo na performance, indo de lá para cá e interagindo bastante com o público; é possível até ouvir nas gravações amadoras da tour a voz de fãs cantando em seu microfone! Próximo do final, ela se aproxima da frente da plataforma, e entoa os versos que finalmente concretizam o show: "Life is a mistery, everyone must stand alone, I hear you call my name, and it feels like HOME".



Há espaço ainda para um encore: uma performance quase acrobática de Celebration. Ela deve simbolizar o estado de graça que advém da libertação, e recentemente tem sido apresentada junto a Give It 2 Me, mudança essa que deve vir ao Brasil.

A MDNA Tour é mais um grande espetáculo no qual tudo o que Madonna sabe de melhor é apresentado perante os olhos do público. Há dança, mistério, há doçura, lamento e ainda um pouco de terror. O interessante é perceber como esses elementos transcorrem naturalmente e nos levam, durante as duas horas de espetáculo, a viajar com a cantora de um estado de espírito a outro. Do escuro à luz. Da dor à cicatriz. E como a própria Madonna disse a Luciano Huck em entrevista recente, entregar-se aos shows foi sua maneira de se libertar de questões pessoais que ainda a machucavam - certamente, viajar com ela pode nos proporcionar o mesmo sentimento.


sábado, 17 de novembro de 2012

"Lírio em sua Alma"

Decidi vasculhar um pouco no meu arquivo de textos desses últimos 6 anos, e achei um que ao ler, lembrei de como amava. Foi escrito ao som da música postada logo abaixo, uma das minhas prediletas da sempre bem vinda Kate Bush.

“Lírio em sua alma”

Estava andando
Pelas paredes de
Meu quarto,
E observava
Os quadros
Nos quais pisava

Suas molduras
Não conseguiam
Limitar
O que neles
Eu via
Mas quebrava
Todas elas,
Por um intuito
Estúpido e
Real,
Tal qual
Um instinto,
O mesmo que guia
Sua cega
Tecelã

Pois,
De todos meus
Movimentos,
Poucos deles
Não foram aprendidos
Por mim
E não me resta
A indulgência
De sobreviver...
Resta-me cólera!
Cólera por
SUPERVIVER

Andar além de meus pés
Escrever além de minhas mãos
Olhar além de mim

Além do que esteve guardado,
Aqui



"You crush the lily in my soul"

sábado, 20 de outubro de 2012

Erotica: 20 anos do erotismo amoroso de Madonna

Nota: cada música citada tem em seu nome o link para ouvi-la.




É bem verdade que Madonna ainda hoje é vista como uma vagabunda, por muita gente. E a raiz dessa visão tão reduzida dela remonta aos primeiros 10 anos de sua carreira, que culminaram com seu trabalho mais polêmico e, consequentemente, mais mal interpretado pelo público em geral: Erotica, lançado em 1992 e completando 20 anos de “nascimento” hoje, dia 20 de outubro de 2012. O grande “problema” na forma como o Erotica foi divulgado residiu na tríade do qual ele fez parte, junto com o filme “Corpo em Evidência” e com o Livro “Sex”; bem dizer, foram as imagens, capazes de surpreender até pessoas que tem boa relação com sua sexualidade, que causaram um buzz negativo sobre a imagem da própria Madonna. Como na carreira dela e de artistas pop em geral a imagem conta muito, o álbum foi completamente subestimado e rotulado pelo público como “sexual demais” e até “vulgar”, o que maculou a cantora para as grandes audiências... Uma pena.

Erotica nos é apresentado por um alterego de Madonna, Dita Parllo, uma dominatrix com roupas de couro, máscaras e acessórios sadomasô a tiracolo (veja o clipe de Erotica). Com uma voz sussurrada e falando sobre coisas como “I’d like to put you in a trance” ou “I don’t think you know what pain is”, Dita nos conduz a um universo no qual o prazer se confunde com a dor, e sobre o qual ela se debruçaria para nos mostrar até onde poderíamos chegar quando o assunto é sexo. Seguida por uma versão dançante e abusada para a canção Fever, o começo do disco denota que a ideia é: transe, transe e transe um pouco mais. Não que isso seja ruim, mas a questão é que os caminhos traçados pelo Erotica vão confundindo esse apetite voraz com uma diversidade de sentimentos e emoções que se relacionam à sexualidade humana, mas não somente ao ato sexual em si. Dessa forma, a longa jornada que este disco representa (é o mais longo da carreira de Madonna, ela mesma disse ser um disco duplo), nos faz visitar decepções amorosas, relações de poder e “defecação sentimental”, fobias sociais e AIDS, bem como o desejo quase pueril de se viver o AMOR, tanto na espera por quem se ama como no lamento por quem se foi.

Dessa maneira, a cantora explora nuances e desafia tabus que, diga-se de passagem, ainda assombram nossa sociedade, e até nós mesmos. Madonna fala de forma bem humorada sobre o sexo oral (algo que muita gente ainda acha “pecaminoso”) em Where Life Begins, e nos apresenta a uma pessoa que não consegue se entregar por completo a um relacionamento por causa dos “ensinamentos” (possivelmente religiosos) que recebeu de seu pai (Deeper and Deeper); discute a condição depreciativa de uma mulher que se esconde em si mesma e acaba se entregando a certos vícios para compensar sua dor existencial (Bad Girl), bem como relacionamentos doentios em que o parceiro não demonstra muita consideração por ela, deixando-a esperando por uma resposta que não virá (Waiting e Bye Bye Baby). Há espaço ainda para tratar sobre exclusão social e AIDS, temas que até hoje são vivenciados por certos grupos sociais, a exemplo dos LGBT (Why's It So Hard e In This Life). Chega a ser surreal imaginar Madonna perguntando em 1992, “why’s it so hard to love one another?”, e 20 anos depois questões simples como essas ainda fazerem total sentido para nossa planeta... Surreal e triste.

Se só por isso “Erotica” já se torna um disco essencial, imagine se dissesse que o zênite criativo não está exatamente nessas canções? É quando a cantora se despe da armadura de dominatrix e de sua fanfarra sexual, assumindo o desejo ardente de amar e ser amada, que o álbum floresce e mostra a beleza e melancolia tão próprias de Madonna. Em Rain, canção dedicada à sua mãe, mas que se encaixa perfeitamente para um casal do qual uma das partes precisou partir, ela canta sobre o sentimento de perda e a esperança ardente pelo retorno. São versos formosos, cheio de doçura e que só se tornam ainda mais bonitos com o clipe da canção, uma obra prima (assista).

"Waiting is the hardest thing
(It's strange, I feel like I've known you before)
I tell myself if I believe in you
(And I want to understand you more and more)
In the dream of you with all my heart and all my soul
(When I'm with you)
That by sheer force of will
(I feel like a magical child)
I will raise you from the ground
(Everything strange)
And without a sound you'll appear
(Everything wild)
And surrender to me

To love"

Se não bastasse a beleza de Rain, Madonna guardou para o encerramento do álbum uma das melhores canções de sua carreira: a balada jazz Secret Garden. Relatando os sentimentos e reflexões de uma alma torturada, uma flor pisoteada, a personagem demonstra que ainda não endureceu e sim, continua acreditando que pode encontrar quem a ame de verdade. E assim, canta:

“I still believe, I still believe
'Cause after all is said and done
I'm still alive
And the boots have come and trampled on me
And I'm still alive
'Cause the sun has kissed me, and caressed me
And I'm strong, and there's a chance
That I will grow, this I know
So I'm still looking for
A petal that isn't torn
A heart that will not harden
A place that I can be born
In my secret garden

A rose without a thorn
A lover without scorn”

“Uma rosa sem espinhos... Quem me ame sem desdém”. Lindo.

Tudo o que falei aqui é a ponta do iceberg dos temas que o disco aborda. E se fosse lhes indicar um bom álbum para entender e se surpreender com Madonna, não tenho muito o que falar, é este. Pois nele há sexo, há revolta, há coragem, fragilidade e amor; Em Erotica, há um pouco de tudo o que almejamos na vida, tornando-o simplesmente indispensável. E deixo com vocês versos que, certamente, vão bater na sua porta um dia:

“Only the one that hurts you can make you feel better
Only the one that inflicts the pain can take it away...

Erotic -a”



sábado, 13 de outubro de 2012

Soneto do mal estar estomacal

Essas coisas que lhe afligem quando sua janta não desceu muito bem...

Soneto do mal estar estomacal

Eu sou barriga vazia
Com coisas a vomitar
E vou expurgar o vazio
Até eu me eviscerar

Um tanto agonizante
A ânsia por expelir
Apago, mas num instante
Eu volto a me implodir

E temo que dedos singelos
Escapem do que espero
Desejo que saia daqui

Se com meus dedos singelos,
Já não consigo o que quero...
Ao vômito explodir

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

"O grito que rompe o silêncio"

Sobre uma alma calada, quando se espalha.

O grito que rompe o silêncio

Seus dedos percorrem os fios,
Os fios de meu pouco cabelo
E assim o terror se espalha,
Assim é nutrido o desejo

Como gota derramada,
Formando chuva, enxurrada
Um quieto animal da enseada,
Encharcando suas pegadas

Suas mãos seguram meus braços,
Trazem-me para perto,
Frente a frente, lábio a lábio
E sinto o calor que se espalha,
Como chama revelada,
Formando luz
E trovoada

Seu corpo então me aceita,
Perfurando minha resistência,
Rompendo a membrana da alma

E ela se espalha

Como fogo, como água,
Por você,
Meu amor,
Esta alma se espalha




"Just ride..."

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Feliz dia dos irmãos!

Dia dos Irmãos

Tem horas do dia em que sinto sua falta
Quando seu abraço é tudo o que falta
E assim, de repente, me vejo tão só
Do céu ao destino,
Desato este nó

Mas dentro de mim, há sua presença
Horas que me abraço em sua presença
E nada mais dói, me foge esta ausência
Eu sigo comigo,
Esqueço a sentença

Pois lembro que a vida é um livro incompleto
Com horas noturnas, mas manhãs tão certas
E sei das histórias que hei de escrever
Posso seguir só,
Mas tenho você

Por isso o sorriso
E os pés no caminho
Seu amor me habita
Não estou sozinho



"(...) Wounds can heal. All of these things are true."

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Retrospectiva: Quem é Tori Amos?

NOTA: assim como Madonna fez aniversário recentemente, Tori Amos também está de parabéns hoje. E este é meu presente pessoal a ela ^^



Tori Amos não é uma artista pop. O culto em torno de sua imagem pelos fãs faz com que haja uma aura de diva bem próxima da existente em torno de Madonna, Lady Gaga e tantas outras que se destacam por fazer músicas com maior apelo comercial, além de shows envolvendo todo tipo de parafernália tecnológica e números de dança, auxiliando-as a apresentar suas canções... Não que isso seja ruim (adoro esse lado também), mas Tori não é uma artista pop exatamente por mais se valer de suas emoções, uma boa iluminação e muitas vezes apenas seu piano para hipnotizar a plateia e, sem dúvida, entregar um grande espetáculo. No entanto, um traço que une Amos a essas outras cantoras é o fato de que ela viveu em frente aos olhos do mundo. Usando-se de personagens e todo tipo de artimanha para garantir sigilo (quando necessário) às pessoas envolvidas, Tori sempre falou de suas experiências, seus problemas, dúvidas e soluções que encontrou na tentativa de alcançar cura... Mesmo que não esteja cercada de mil paparazzi e coisas do tipo, acompanhar sua carreira é, sem dúvida, acompanhar sua vida.

É através dessas pequenas crônicas cantadas por ela que muitos conseguiram refletir sobre o que vinha acontecendo consigo mesmos, em busca dessa mesma cura. Mas Amos nunca ofereceu a solução mais simples, de autovitimização, de crer que o inferno é o mundo e nós temos de fugir dele para sermos felizes e satisfeitos... Durante os 20 anos de sua sólida carreira, a busca por algo mais factível e menos isolador é a trilha de seu caminho; e é sobre este caminho que me debruçarei um pouco para entregar a vocês uma retrospectiva de minha maior inspiração, como pessoa e artista.

Em 1992, Tori lança seu primeiro disco como uma artista solo, o arrebatador Little Earthquakes. Tratando de vivências pessoais, algumas mais comuns, como fins de relacionamento, e outras mais drásticas, um estupro, ela narra em suas 12 canções seus sentimentos mais íntimos, criando assim as primeiras peças que ajudariam a entender quem era essa moça de cabelo ruivo vivo, tocando piano de forma tão magistral. A primeira canção dela a ganhar um clipe, Silent All These Years, trata por exemplo da sensação de não sermos ouvidos por um longo período, o que consequentemente faz com que nos sintamos irrelevantes... Cantando que "esteve aqui, calada todos estes anos", ela rompe o silêncio de seu espírito amedrontado na tentativa feroz de ter coragem, coragem de mostrar a todos quem ela era ou ao menos quem queria ser. Assim ela falou sobre: religião e a noção de culpa incutida em todos os grandes cultos organizados (Crucify); sentir-se uma objeto sexual e acabar não estando satisfeita em seus desejos (Leather); reminiscências familiares e problemas vivenciados também no âmbito escolar (Winter e Precious Things); e a melancolia, um traço que por muitos anos marcou sua obra (Little Earthquakes).



A julgar pelos tópicos tratados já em seu primeiro disco, era de se esperar que Amos fosse uma feminista. E sem dúvida foi o feminismo a força motriz para seu segundo álbum, o aéreo Under The Pink. Todas as temáticas do Little Earthquakes foram acirradas e tratadas de forma ainda mais confrontacional, como é o caso da rancorosa God, em que ela pergunta a Deus se ele não precisa de uma mulher para cuidar dele, ou da gentil Past The Mission, uma bela balada na qual Tori toca em um assunto do mundo religioso que se tornaria central, adiante em sua carreira: Maria Madalena e Jesus Cristo. Como dessa vez o mote era feminino, as relações interpessoais estabelecidas entre mulheres tiveram papel central sobre o Under The Pink, e é justo o que ouvimos em Cornflake Girl e Waitress, músicas que falam sobre damas traindo damas, ou Bells For Her, na qual Amos discursa sobre a dificuldade em lidar com o vazio existencial de uma de suas irmãs de alma, Beenie. O disco fecha em uma nota altíssima, ao convidar uma orquestra para ampará-la na odisseia chamada Yes, Anastasia. Usando a história da princesa russa Anastácia Romanov como pano de fundo para a sua própria, Tori convida suas congêneres a perceberem o quão corajosas elas são, e que precisariam apoiar, umas às outras! É estupendo.

Depois de dois discos próximos sonicamente, Amos acaba trazendo à tona em sua obra um crack surgido com o rompimento de um relacionamento de 7 anos. E este rompimento não ficou evidente somente nas letras; a música dela foi profundamente afetada, já que agora ela cantava de forma sufocante, agressiva e extremamente catártica (coisa pouco comum em registros de estúdio para qualquer artista), além de suas habilidades com instrumentos de teclas estarem mais aguçadas do que nunca! Não contente em tocar só o piano, ela decidiu trazer vozes "masculinas" na forma de outros instrumentos, caso do cravo e do clavicórdio. Tudo isso resume-se num disco chamado Boys For Pele. E ele ganhou esse nome por Pele ser a Deusa havaiana do fogo e destruição, e haver uma antiga tradição que a ela dedicava garotos, sendo estes sacrificados ao serem jogados na cratera de um vulcão ativo. Os ditos "garotos" seriam as ilusões de Amos, e assim estaria ela, completamente despida de qualquer vaidade, jogando um a um seus garotos no fogo. A dor de ver parte do que alimenta seus sonhos morrer é algo capturado com maestria em canções como Blood Roses, Caught a Lite Sneeze e Hey Jupiter. Mas sobra espaço pra canções mais conscientes e depuradas, na forma das belas Doughnut Song, Putting The Damage On e Twinkle. Por muitos, o Boys For Pele é considerado a obra prima de Tori; sem dúvida, é uma viagem sem volta.



Passado todo o calor envolvido na produção do Pele, Tori encontrou um novo amor, Mark Hawley (com quem é casada até hoje), e em algum tempo decidiram se casar. Durante este período, ela acabou engravidando e pouco depois, sofreu o primeiro de uma sequência de 3 abortos (entre 97 e 99). Mesmo com sua vida pessoal voltando aos eixos, a perda de seu primeiro filho fez com que a cantora se sentisse ferida em sua essência, infértil como mulher... Ela decidiu então que se não podia criar no sentido biológico, criaria musicalmente, e assim nasceu mais um disco, o sombrio e aquático From The Choirgirl Hotel. Logo no início do novo trabalho, ela anuncia de forma lugubre em Spark que "poderia sustentar uma geleira, mas não manter o bebê vivo"; o refrão desta canção surge de forma quase abrupta, como de um surto psicótico, anunciando um dos meus versos prediletos dela: "você diz não querer, mais de uma vez, mas não é bem isso que pensa... Você diz não gostar do circo onde nos metemos, mas não é bem isso que pensa". A partir dele, as canções vão se apresentando, ora sexies, ora românticas, ora surtadas, mas todas emocionais ao extremo... Foi através delas que Amos conseguia encontrar algum consolo para suas questões inacabadas.

Com o término da Plugged Tour, sua primeira turnê acompanhada de uma banda, Tori decide lançar seu primeiro disco de canções ao vivo, baseado em apresentações desta incursão. To Venus and Back, no entanto, tornou-se um álbum duplo, com 11 faixas inéditas, de temáticas diversas, como deja vus dos anos 80 (Glory of The 80s) ou a dor da despedida (1000 oceans), mas unidas através de uma sonoridade mais eletrônica e etérea, se comparada à do Choirgirl. Tempos depois de lança-lo, Tori sofreu um último grande golpe em sua vida pessoal, numa situação extremamente delicada: ela trabalhava com uma orquestra na composição de duas músicas para o filme Great Expectations (uma delas é a urgente Siren), e começou a ter um leve sangramento que não estancava. Com o término dos trabalhos, foi levada a um hospital e acabou descobrindo que se tratava de seu terceiro abortamento. Recebida a alta hospitalar, ela teve ainda de cumprir com agenda de compromissos a "pedido" da gravadora, e pôde então ir com seu marido descansar em sua casa na Flórida, tentando assim levar uma vida normal por algum tempo. Amos descreve em sua biografia (Piece by Piece, 2005) que nesse período, fazia longos passeios pela praia e num deles, entrou numa espécie de ritual e perguntou à Mãe-Terra o porquê de ter perdido seus filhos. Segundo a própria, a resposta dada pela Terra foi de que ela mesma perdia milhares de filhos, todos os dias, e tinha de suportar a dor também. Desse período menos atribulado e de contato mais íntimo com a essência materna, nasceria uma obra prima, o Scarlet's Walk, bem como sua filha de carne e osso, Natashya Hawley.



Em setembro de 2000, nasce Tash, e com ela, um conexão maior com as origens de sua mãe: dona Mary Ellen Amos é descendente da tribo norteamericana Cherokee, uma das muitas que foram dizimadas e/ou não tiveram seus direitos humanos respeitados pela voracidade dos colonizadores, que se estabeleceram no atual território dos EUA. Dessa maior conexão surgiu uma necessidade de "fazer justiça" a essas tribos, o que gerou o embrião do Scarlet's Walk. Antes dele, porém, Amos precisava lançar mais um disco com sua gravadora à época, Atlantic Records, e como sua relação profissional com os dirigentes da mesma só ia de mal a pior desde 1998, ela não queria que suas novas composições fossem veiculadas a eles. Dessa forma, a cantora gravou um disco de covers, o Strange Little Girls, no qual re-trabalhou canções compostas por homens, numa perspectiva feminina. Desse disco, temos um cover pungente de Bonnie & Clyde, do Eminem, bem como interpretações emocionantes para Rattlesnakes, composição de Lloyd Cole, e Real Men, de Joe Jackson.

Passadas as obrigações contratuais, ela se veiculou a um novo selo e finalmente planejou o lançamento de seu novo disco. Scarlet's Walk não só tenta dar voz às tribos e grupos indígenas dizimados em território norteamericano, mas também recobrar a identidade de um Estados Unidos extremamente ferido pelo atentado terrorista de 11 de setembro de 2001. Isso fez com que Tori se pusesse no papel de Scarlet, uma heroína que iria, viajando de carro, visitar todo o país, encontrando em seu caminho figuras típicas deste mundo para, através disso, encontrar a si própria, sua identidade. O que se vê nas 18 canções deste romance sônico (palavras de Amos) é basicamente uma garota envolvida em relacionamentos difíceis evoluir até se tornar uma mulher consciente e capaz de distinguir com mais clareza quais coisas importam (e quais não) em sua vida. Deste passeio, surgem pérolas como A Sorta Fairytale (maior hit da carreira de Tori), Carbon, Pancake, Taxi Ride e Gold Dust, aquela que, sem dúvida, é uma das melhores músicas compostas pela pianista. Scarlet's Walk marca uma fase nova em sua carreira, baseada em álbuns conceituais e mais políticos; invés de tratar somente de conteúdos íntimos e de sua psique, através da maternidade a cantora passou a demonstrar em suas composições mais consciência acerca também do mundo de fora. Tori afirmou à época que ter Tash em seus braços lhe deu uma completude que nunca havia sentido antes, e é inegável a influência da maternidade nos rumos de sua carreira.



Em 2005, Amos lança seu 8º disco de estúdio, The Beekeeper, criando seis linhas temáticas as quais chamou de Jardins. O disco denota outro aspecto curioso de seus futuros lançamentos: praticamente todos teriam, a partir de agora, mais de 70 minutos de duração, fato este que acabou gerando críticas à cantora, sobre a coerência de seus trabalhos. De uma forma ou de outra, este é um disco suave, inovando com a presença do órgão Hammond em sua composições, e que toma como centro para sua construção os textos dos Evangelhos Gnósticos, os quais apontam Jesus e Maria Madalena como sendo um casal. Isso acaba tendo uma ressonância feminista, já que ao alavancar a importância da discípula a par do Cristo, a mulher passava já naquela época a ter um papel de igual para igual ao homem; além disso, tudo o que na Madalena seria considerado profano poderia se entrelaçar e equilibrar-se com o divino (na figura tanto da Maria Mãe como do próprio Filho de Deus). Dois eventos da vida íntima de Tori também se fazem presentes no álbum: o acidente cardiovascular sofrido por dona Mary Ellen, deixando-a à beira da morte, e a morte de seu irmão mais velho, Michael Amos, pouco depois de sua mãe já estar recuperada. O disco acabou tratando também da dança constante entre a morte e a vida, e os dois episódios acima citados ficam mais aparentes, respectivamente, nas canções The Beekeeper e Toast.

Dando continuidade aos discos conceituais, Amos decide que em 2007 suas linhas temáticas não seriam marcadas por jardins, mas sim por "garotas". As dolls seriam 5 personagens que dividiriam os vocais, opiniões e sentimentos expressos em American Doll Posse, título sugestivo por lembrar a palavra Pussy (b*ceta, em inglês hahaha). Isabel, Clyde, Pip, Santa e Tori (sim, a própria) seriam desmembramentos da personalidade da pianista, cada uma inspirada por uma divindade do panteão grego, e assim cantariam sobre política, desilusão, revolta, sensualidade e amor, de maneiras diversas. Além de emplacar canções que já se tornaram clássicas para os fãs, como Big Wheel, Bouncing Off Clouds, Almost Rosey, Body and Soul e Beauty of Speed, a turnê deste disco teve um quê a mais, já que toda apresentação foi aberta por um set de 5 a 6 músicas de uma das dolls, antes de Tori entrar para o set principal. Se Scarlet's Walk foi o projeto temático mais ambicioso da pianista, sem dúvida American Doll Posse é o mais ambicioso visualmente, já que o cuidado com a caracterização de cada uma das personagens é patente e funcionou bastante com o público.



Após o exacerbo conceitual que foi o ADP, Tori decidiu fazer um disco que soasse mais como uma coleção de canções mesmo, no qual exploraria as relações de uma personagem feminina com o poder e a opressão. Mesmo sendo um terreno familiar para a cantora, Abnormally Attracted to Sin soa de forma distinta dos outros trabalhos, pelo uso de teclados eletrônicos e novas influências, como o trip hop em Give, ou o formato "balada clássica com cordas", a exemplo de Maybe California. Ainda que Abnormally... já tivesse se afastado um pouco da noção de "conceito", as dolls ressurgiram em gravações que originaram vídeos para 16 das 17 faixas do disco; os visualettes vinham acompanhando a edição especial do CD, e neles vemos as cinco personagens em situações diversas. No mesmo ano em que lançou o AATS, 2009, saiu também o primeiro disco de Tori de caráter natalino, ainda que ela tenha insistido em afirmar que era um álbum em homenagem aos solstício de inverno, não exatamente à data cristã. Midwinter Graces é um álbum singelo e acolhedor, mas sem grandes destaques musicais, a exceção de canções como Star of Wonder, Snow Angel, Pink and Glitter (na qual Tori se aventura no universo das Big Bands) e Winter's Carol, canção esta extraída do musical no qual ela trabalha desde 2008, The Light Princess (nome provisório).

The Light Princess é uma peça musical derivada de um conto de fadas homônimo, escrito por George MacDonald. Tori tem trabalhado na composição e montagem do espetáculo há alguns anos, e no momento ele está engavetado sem previsão de lançamento. Mesmo nessas condições, ter assumido o esforço de escrever a peça serviu para o próximo passo tomado pela pianista em sua carreira: escrever um ciclo de canções de música clássica, usando a estrutura de um octeto e tomando como base para as novas canções peças eruditas de compositores como Chopin, Mendelssohn e Debussy. Night of Hunters foi lançado em 2011, garantindo a Amos não só boa recepção da crítica, mas também um prêmio Echo e sua primeira tour acompanhada de músicos do universo clássico (no caso, um quarteto de cordas). Algumas das faixas do álbum já são consideradas tesouros da compositora Tori, como Shattering Sea, Star Whisperer e Carry, e deram caminho para seu projeto mais recente, a coletânea Gold Dust.



A ser lançada em outubro deste ano, Gold Dust comemora os 20 anos de lançamento de seu primeiro álbum, Little Earthquakes, e é composto de 14 regravações acompanhadas de uma orquestra sinfônica, a Metropole Orchestra. A ideia do disco surgiu em 2010, quando a cantora promoveu um show em companhia da mesma orquestra, e sentiu a necessidade de registrar em estúdio o trabalho que desenvolveram juntos. Como já estava programado o lançamento do Night of Hunters, ela decidiu que só lançaria a nova coletânea no ano seguinte, vindo a calhar com suas duas décadas de produção artística solo.

Tori Amos demonstrou durante toda sua vida produtiva uma capacidade única de transformar situações opressivas e dolorosas em pequenas pérolas, pérolas estas que juntas, formam um dos colares mais belos que um artista poderia ostentar. E o mais importante de sua mensagem é exatamente isso: se você deseja cura, precisa ir fundo no que está errado, beirando a loucura se preciso, para enfim chegar a uma solução. O que melhor define seu espírito, como compositora, musicista e até pessoalmente é exatamente a força de enfrentar tudo para, com justiça, fazer as coisas voltarem a seu lugar.

E este é só um dos motivos para a ela admirar. E amar <3



“I see the dream and I see the nightmare, and I believe you can’t have the dream without the nightmare.”

- T.

sábado, 18 de agosto de 2012

Quais são os outros sentidos?

Vivemos num mundo em que a informação visual conta ao extremo. Mas o que vemos nem sempre é verdadeiro. O que vemos às vezes engana mais que esclarece, mesmo quando vislumbramos um anjo de luz à nossa frente... E quando a visão falha, ou ela não nos serve de nada, é preciso lembrar que a mais a sentir.

Sempre há mais a sentir do que somente o que os olhos tem a iludir.

Pelo que sente

Meu coração é azul
Azul do céu mais escuro,
Aquele que não se vê
Do céu mais puro e profundo,
Fundindo-se no universo
Sem uma razão porquê

Extensão,
Não se vê

Meu coração é um breu
Onde vagamos, eu e você
Sentimentos e razões
Que não são de ninguém
Só não nasceram,
Não nasceram para morrer

Mesmo escuro,
Nada a temer

Pois do ausente roubei esta cor,
Este azul de anoitecer
Onde não surgem estrelas,
Ainda que exista beleza,
Completamente escondida
De sua pobre visão

Pois digo, são outros, amigo...
São outros os certos sentidos
Levando a meu coração

Sinta-os em minha mão
(Escura)
Sinta o meu coração




"A voice, if inaccurate"

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Em honra ao 55 anos de Madonna!

NOTA: O texto foi escrito originalmente em 2012, mas recebeu um update nas informações referentes a 2013, afim de comemorar os agora 55 anos da Rainha do Pop!

Hoje é aniversário da Madonna.
Hoje ela completa 55 anos de vida.
55 anos dos quais mais de 30 foram dedicados à sua carreira artística.
Carreira esta que rendeu a ela vários prêmios, de Grammys até Globos de Ouro, mais de 300 milhões de disco vendidos, "muita polêmica, muita confusão" (rs), milhões de fãs enlouquecidos e o mais importante, uma voz capaz de levantar até hoje questões relevantes sobre o modus operandi doentio de nossa sociedade. Sua genialidade, no entanto, vem do fato dela sempre ter representado o veneno e a cura. Madonna nunca teve intenção de ser uma artista gratuita.

Desde 1983, quando lançou o primeiro disco, "Madonna", ela deixava claro a necessidade que tinha de ter poder. Disse na época que seu objetivo era "Dominar o Mundo", e considerando o teor frívolo e doce de suas músicas até então, não daria para se esperar tanto dessa garota que veio de Michigan para NY, tentando a duras penas alcançar o sucesso. Quando lançou seu segundo disco, porém, as coisas se tornaram GRANDES e este tão almejado sucesso bateu à sua porta, na forma de seu primeiro hit esmagador, Like a Virgin. Foi com essa música também que, no VMA, a cantora cravou sua primeira polêmica: vestida de noiva, desceu de um bolo de casamento imenso e ao perder um dos sapatos no meio da performance, deitou no chão, rolou, mostrou a calcinha e deixou todo mundo estarrecido com sua ousadia! Essa parece ter sido sua primeira polêmica gratuita... Mas foi a última.



Logo em 1986, Madonna lança o primeiro disco em que teve participação total na produção. True Blue não só trouxe à tona alguns dos maiores sucessos da cantora (Open Your Heart, La Isla Bonita, Live To Tell), como também mostrou que ela agora tinha algo mais sério a dizer: em Papa Don't Preach (música e vídeo), Madonna interpreta o papel de uma adolescente que se apaixona, perde a virgindade e acaba engravidando. Ela pede ao pai na letra que não a passe um sermão pelo feito, emendando com uma decisão já tomada: ela ficaria com seu bebê. Grupos anti-aborto pediram que ela usasse a música como um meio de defender esta causa, mas a cantora resumiu-se a dizer que era a favor da vida e preferiu não tomar partido. O uso do termo Papa também não foi aleatório: ficou claro na turnê que deu suporte ao disco, Who's That Girl Tour, que usá-lo serviu como uma metáfora ao pontífice da Igreja Católica Apostólica Romana, uma vez que na performance da canção projeções dele surgiam no palco, concluindo-se com a expressão SAFE SEX. Começava-se enfim a criação da mistura bombástica de religião e sexo, algo que Madonna sempre soube fazer bem o suficiente para explodir!

Em 1989, é lançado um de seus discos mais marcantes: Like A Prayer. Sendo puxado pela misteriosa canção-título, na qual a cantora confunde o ouvinte se está falando sobre o êxtase espiritual ou a sensação do orgasmo (ou ambos), Madonna sinaliza aqui para suas próprias confissões. Nascida e criada numa família católica e conservadora, e tendo perdido sua mãe quando tinha somente cinco anos, havia aí questões e temores que começaram a ser explicitados nas 11 canções componentes de Prayer. Desde a melancólica Promise To Try, na qual disseca a saudade que sente da presença materna, até a contundente Express Yourself, hino de autoafirmação feminina e gay (honrosamente um dos maiores públicos de Madge), Madonna já demonstrava maturidade artística e finalmente estava se usando das canções para expurgar seus próprios demônios... O próximo passo, enfim, seria expurgar aqueles que povoam a sociedade.

Logo após o estrondoso sucesso de Vogue, seu maior hit, e da Blond Ambition Tour (1990), de onde saíram performances inesquecíveis, como a de Like A Virgin, Madonna estava pronta para assumir riscos ainda maiores, e tratar à exaustão um dos temas mais espinhosos ao ser humano (ainda que lhe seja completamente natural): o SEXO. Erotica foi lançado em 1992, e mesmo com muitos pensando ser este só um disco com canções explícitas, ele na verdade vai fundo nas nuances mais diversas da sexualidade humana. Além do sadomasoquismo da faixa-título, são tratadas neste disco questão como submissão sentimental (Bye Bye Baby, Waiting), vazio existencial (Bad Girl), falhas de comunicação (Words) e até amor, do tipo mais gentil (Rain). Coube espaço também para um relato melancólico em honra de dois grandes amigos mortos por AIDS, na canção In This Life, bem como um hino pela liberdade, Why's It So Hard. Infelizmente, o álbum foi subestimado e ofuscado pelo lançamento do Sex Book, um livro no qual a intérprete M se mostra em situações extremamente lascivas e até pornográficas, mas com uma razão além da dita autopromoção: Madonna sempre explicitou durante toda a divulgação de ambos projetos que seu objetivo era questionar tabus, e fazer com que as pessoas repensem o porquê de tudo aquilo ser considerado "sujo e vulgar", se todos fazemos ou pelo menos pensamos em sexo, vez ou outra, vez em sempre. Mesmo que sua imagem tenha sido ferida aos olhos de muitos norteamericanos, a cantora organizou uma tour riquíssima em significados e arte, The Girlie Show, que visitou vários países, inclusive o Brasil, em meados de 1993.



Passada toda a polêmica envolvendo esta fase da carreira, a cantora decidiu fazer trabalhos de sonoridade mais íntima, e foi o caso de Bedtime Stories e a coletânea de baladas, Something to Remember. Mesmo num ritmo mais tranquilo, ela conseguiu emplacar grandes sucessos (I'll Remember, Take A Bow, Secret, You'll See), e não deixou de alfinetar aqueles que não entenderam sua mensagem no Erotica, através da canção Human Nature ("I'm not your bitch, don't hang your shit on me"). Foi pouco depois desses lançamentos que ela conseguiu seu grande êxito como atriz: Evita. Marcado pela canção Don't Cry For Me Argentina, o filme rendeu a ela um Globo de Ouro como melhor atriz em comédia e musical, bem como garantiu o treinamento vocal necessário para a maior virada de sua carreira: o iluminado Ray Of Light.

Durante as gravações de Evita, Madonna descobriu-se grávida, e ao ter sua filha, Lourdes Maria, em seus braços, sentiu-se renovada como ser humano. Junte a isso o início de seus estudos na doutrina da Kaballah, marcante até hoje em seus trabalhos, e a essência do Ray of Light já existia. Madonna, porém, teve dificuldades em encontrar quem a ajudasse a dar forma musical ao disco, e depois de muito pelejar, encontrou o piradinho produtor inglês William Orbit, responsável por fazer de suas canções "uma ousada mistura de trance, trip-hop, drum'n'bass, pop e belos arranjos orquestrais", palavras da própria. O disco foi um sucesso arrebatador de crítica e público, fazendo com que finalmente a opinião pública fosse unânime: Madonna era de fato uma artista, não somente uma máquina de fazer dinheiro, como muitos ainda alardeavam à época. O álbum rendeu a ela 4 grammys, clássicos como a faixa-título, Frozen e The Power of Goodbye, ao mesmo tempo que deu aos fãs um disco que ainda soa rico e atual, mesmo depois de quase 15 anos de lançamento.

Agora que Madonna tinha sofrido uma completa mudança em sua carreira, qual foi o passo seguinte? Declarando que a vida seria uma droga se fosse profunda e feita de provações o tempo todo, sua decisão foi por lançar algo que misturasse a introspecção anterior com sua verve mais divertida e frívola: disso nasceu Music. A cantora estava também em um ótimo momento da vida pessoal, já que casara com o cineasta Guy Ritchie e do relacionamento, tinha nascido seu segundo filho, Rocco; tudo isso fez com que Music tivesse desde canções extremamente apaixonadas e entregues, como Impressive Instant, Amazing e Don't Tell Me, até outras mais tristes e reflexivas, como Paradise (Not For Me) e Gone. Do disco, porém, o grande destaque foi para a faixa que deu nome a ele, Music: simples e certeira, foi seu primeiro number one na Billboard Hot 100 em 7 anos! Ao dizer no refrão que "a música faz as pessoas se juntarem; a música mistura a burguesia e o rebelde", Madonna ditou sabiamente a principal sensação vinda dessa e de outras artes: a de pertença, de que sempre há algo ou alguém que nos reflete, lá fora.



À medida que sua popularidade voltava ao topo, a cantora via uma guerra se formar. Após o gravíssimo atentado de 11 de Setembro de 2001, responsável pela derrubada das Torres Gêmeas de Nova York, os Estados Unidos estavam dispostos a destruir a organização terrorista responsável pelo episódio, e mandariam assim tropas do exército para o Afeganistão, atrás do hoje morto Osama Bin Laden. Como muitos outros artistas que decidiram tratar do tema e alertar sobre os riscos que a guerra traria, Madonna se debruçou na composição de um dos seus discos mais refinados e políticos, American Life. Talhado com o objetivo de criticar a sociedade norteamericana, bem como tratar de questões mais pessoais (à semelhança do Like A Prayer), a música que nomeou o disco foi escolhida como primeiro single e veio acompanhada de um dos clipes mais corajosos já lançado pela cantora. American Life mostrava cenas de um desfile de moda na qual primeiro passavam pela passarela modelos vestidos em temática militar, para depois começarem a surgir pessoas mutiladas, mulheres pegando fogo e crianças sendo arrastadas. A plateia acompanhava as desgraças da guerra em frenesi, e Madonna então entrava num tanque e soltava uma granada nelas, como uma crítica feroz à sociedade em que vivíamos e ainda vivemos. Foi um passo bravo, mas extremamente mal interpretado. Norteamericanos consideraram a atitude profundamente desrespeitosa com os militares que já estavam em combate, bem como uma afronta à nação estadunidense; na tentativa de suavizar as críticas, a cantora decidiu censurar o vídeo e declarar que sua intenção era alertar, não desrespeitar... Não foi o suficiente. O álbum não deu continuidade aos êxitos passados nos EUA, mesmo tendo sido bem recebido no restante do mundo. Madonna então teve de apelar para uma tour de seus maiores sucessos como forma de apaziguar as críticas, a saudosista Re-invention Tour, e para sua próxima era, decidiu que precisaria de uma mudança total, mais uma vez. Brotava assim o Confessions On A Dance Floor.

Puxado por Hung Up, seu maior hit mundial nos anos 2000, o disco de 2005 trazia uma Madonna voltada completamente para a pista de dança! Com influências diversas da dance music (ABBA, Donna Summer, Pet Shop Boys...), criou-se o álbum numa sonoridade europop ditada por Stuart Price, produtor inglês que já trabalhava com ela em turnês desde 2001. Confessions foi considerado pela crítica um retorno à forma, e veio acompanhado de sua tour mais sofisticada, tanto sônica como visualmente, a Confessions Tour! Mesmo sendo esta uma era completamente disco, o momento mais marcante do show não nasceu das músicas dançantes: foi a interpretação de Live To Tell que chamou atenção ao espetáculo, causando a polêmica mais sem sentido de sua carreira, uma vez que a mensagem trazida pela performance suprime qualquer tentativa de maculá-la. Madonna volta para o segundo bloco do show numa cruz completamente espelhada, e enquanto canta a primeira parte da música, uma numeração corre no telão acima dela; ao chegar em 12 milhões, revela-se que esta era, em 2006, a estimativa do número de crianças africanas que em 2010 estariam órfãs de pai e mãe, por conta da pandemia de HIV/AIDS sobre o continente. Ao terminar com uma citação bíblica de Mateus 25:40, a cantora entrega ao público talvez a performance mais emocional e poderosa de sua carreira. Nesse período ela também voltou esforços para dar assistência ao Malauí, um pequeno país africano extremamente afetado pela AIDS, e local de nascimento do primeiro filho adotado pela artista e seu marido Guy, David Banda.



Mesmo com todo o êxito do Confessions, Madonna não teve de volta a popularidade de anos passados nos EUA. Ela decidiu então que seu próximo álbum seria dedicado a fundir as tendências black vigentes ao seu tradicional pop, e dessa fusão nasceu em 2008 o Hard Candy. Associada a Timbaland, Justin Timberlake, Danja Hills e Pharell Williams, o disco inicialmente se chamaria Give It 2 Me, e o ensaio de divulgação seria baseado em uma nova personagem, a boxeadora M-Dolla. De última hora, Madonna decidiu que deveria mudar o título, afim de sinalizar que a sonoridade do novo trabalho seria como morder um doce duro: seus dentes quebrariam, mas você gostaria do sabor. Pelo menos para o carro-chefe do disco, 4 Minutes, a proposta deu certo: a música alcançou o 3º lugar na Billboard Hot100, feito este que não se repetiu para os outros singles. Mesmo não tendo sido uma unanimidade de público e crítica, Hard Candy gerou uma constatação e um bom fruto: a constatação era de que o casamento da cantora já não ia tão bem, uma vez que em letras como as de Voices e Devil Wouldn't Recognize You, o desgaste era aparente. O bom fruto foi a Sticky and Sweet Tour, segunda incursão a passar pelo Brasil, que ao arrecadar mais de 400 milhões de dólares, deu a Madonna a turnê de um artista solo mais bem sucedida da história. Vale lembrar que durante a tour, o divórcio de Madonna e Ritchie foi anunciado, fato este crucial para o seu álbum mais recente, MDNA.

Em 2009, além de retomar a Sticky and Sweet Tour para mais datas europeias, foi lançada a coletânea Celebration como último requisito contratual com a Warner, sua gravadora desde o começo da carreira. Ela lançaria seu novo álbum já sob outro selo, mas isto demoraria um pouco, uma vez que até 2011 Madonna esteve imersa na produção e divulgação de seu longa metragem, W.E. Além da adoção de mais uma criança africana, a menina Mercy James, ela foi motivo de fofoca por seu envolvimento com homens mais novos, dentre eles o brasileiro Jesus Luz e Brahim Zaibat, seu atual namorado. Finalmente em 2012 Madonna volta ao mundo da música, primeiro com uma canção retirada da trilha sonora de seu filme, a balada ganhadora do Globo de Ouro Masterpiece. A divulgação de seu novo trabalho começaria de fato com a apresentação feita no intervalo do Super Bowl, a qual deu a Madonna o recorde de Maior Audiência Televisiva nos EUA, e foi através desta performance que seu novo single foi apresentado, Give Me All Your Luvin'. MDNA, um álbum dotado de canções ora furtivas, ora sobre o divórcio recente, rendeu até o momento mais dois singles, Girl Gone Wild e Turn Up The Radio, e mesmo não sendo esta a fase de maior êxito em charts, já ficou marcada como uma das mais politizadas e polêmicas. A cantora, então aos 53 anos, estava mais sensual do que nunca e não demonstrou interesse em aceitar o rótulo de "velha demais para o pop". A última batalha travada por Madonna está sendo contra o "ageism", preconceito com pessoas mais velhas, e isso a fez mostrar os mamilos e as nádegas durante performances de sua atual turnê, a MDNA Tour, bem como apresentar um vídeo arrebatador para a canção Nobody Knows Me, como intervalo de seu show. Neste vídeo, há críticas ferrenhas também a machistas, homofóbicos e políticos de extrema direita, como é o caso de Marine Le Pen. Seu último feito foi criticar duramente o governo russo por ter prendido o grupo Pussy Riot após protesto em capital russa, bem como falar abertamente contra a lei antipropaganda gay de São Petersburgo.



UPDATE: 2013 começou com grandes novidades e expectativas altas em torno de M, tanto pela MDNA Tour como por uma empreitada assumida por ela e o fotógrafo de moda Steven Klein. A turnê lucrou estrondosos 305 milhões de dólares, tornando-se assim a 10ª excursão musical mais lucrativa de todos os tempos; a revista Billboard, inclusive, conferiu à artista o prêmio de tour do ano, dedicando-a uma extensa homenagem no Billboard Awards (veja o vídeo AQUI). Já a empreitada trata-se do #SecretProject, que vem atiçando a curiosidade dos fãs desde que em dezembro do ano passado a cantora foi vista com seus dançarinos, entrando num estúdio fotográfico enquanto fazia shows na Argentina. A data de lançamento do projeto já foi adiada e, por enquanto, se resume a teasers lançados no Instagram da própria Madonna, além de dois trailers que só aumentaram a ansiedade pelo que vem por aí!

Fazer esta retrospectiva teve por objetivo único trazer à tona toda a riqueza que existe por trás de uma das carreiras mais sólidas e bem sucedidas da música popular mundial. Madonna pode não ser a melhor cantora nem ter as composições mais complexas em seus discos; isso não significa, porém, que sua música seja descartável e muito menos sua história, marcada por um dever quase militar em servir à plena liberdade de expressão. Um dos versos mais marcantes já cantados por ela é "Express Yourself, Don't Repress Yourself". E honestamente, se tivesse de resumi-la em uma palava, eu escolheria EXPRESSÃO. Disso ela entende realmente bem.

Parabéns, Madonna, pelo aniversário de 55 anos!
Como seu fã, só me resta lhe dar todo meu amor. Todo meu amor <3


"Life fits living, so let your judgements go! That's how our future should be"

sábado, 4 de agosto de 2012

"O pagador de promessas"

"'Cause all of the stars are fading away
Just try not to worry, you'll see them some day
Take what you need and be on your way
Stop crying your heart out"


O pagador de promessas

É como se não sobrasse poesia,
Só um relato incolor
É como se eu visse o mais pálido,
O mais pálido de minha cor

É como se me devorasse,
Com alma de uma serpente
Como se fosse uma presa,
Presa em ser suja e demente

É como se algo apagasse,
Sempre que acendesse a luz
Assim, que perdesse o sentido
Quando arrancado o capuz

Mas sei, eu preciso acordar,
Preciso ir trabalhar
Preciso ter todo a riqueza
Que vai me tirar desse lar
Pois eu quero me mudar
E não tenho mais anos p’ra dar
Já não me conte seus sonhos,
Só eles não fazem brotar
Eu quero somente seus braços,
Vontade de me levantar
Que sua mão me agarre,
Me tire desse mal estar
Pois em sua guia eu confio,
Você quem prepara meu chão
Não piso em cacos de vidro
Nem nestas migalhas de pão
Recobro esta pouca esperança
Naquilo que é seu e eu sei:
Se hoje sou um miserável
Amanhã, quem sabe, sou rei

E isso me faz acordar,
Preciso ir trabalhar
Guardar-me de nossa pobreza
Até nada mais nos matar
E só ardermos de amar

Estrelas ardendo,
De amar


sexta-feira, 3 de agosto de 2012

"Antes de ser mais normal"

Não é difícil nos pegarmos pensando que somos alvos de um julgamento constante, e esse paranoia coletiva até pode servir para uma sociedade, mas nem sempre faz bem a um indivíduo. Em parte, viver com essa impressão mostra como queremos ser notados... Ninguém se encheria de cuidados se não quisesse causar uma boa impressão.

A única certeza que existe é: o show acaba. E quando acabar, seremos tão especiais como julgávamos ser? E aqueles que amamos, serão também? Dessas interrogações nasceu o texto de hoje...

Antes de ser mais normal

Você não sabe onde ir
Você até finge que sim,
Mas não sabe onde ir

E estou aqui, de mãos atadas,
Vendo sua perdição
Aproximar-se em passos miúdos,
Quase imperceptíveis
Chegando aos segundos,
Chegando em migalhas,
Perdendo o que havia,
Perdendo de tudo

Estou a ponto de chorar,
Mas não cai uma lágrima
Incrível como a vida não é um show,
Parece até insuportável
Reconhecer o tempo que perdemos
Pensando dessa forma
E já que nem eu nem você
Podemos com o futuro,
(Ainda que o vejamos ao longe)
Que reste a falsa impressão de que
Temos opção...

Não,
Não existe outra opção

E eu vou lhe amar pelo tempo que der
Honrarei seu amor da forma que der
Prometo estar por perto,
Pois você ainda é especial
Mesmo que até isso se perca,
E você, de repente, se torne normal

Ó, meu amor,
Seja especial

Seja isso tudo
Antes de ser mais normal




"I thought you were special... Ah a-a-a-ah"

domingo, 15 de julho de 2012

O Dia Internacional do Homem...

Daí que minha vó me liga, toda feliz, por hoje ser "O Dia do Homem". Fiquei intrigado porque já tinha visto um cartaz na Boticário falando da data, mas é algo que me pareceu tão irrelevante e passou batido... Pois bem, hoje é dia do homem.

Fui dar uma pesquisada na net sobre o assunto e me deparei com um artigo muito bom tratando da origem desta data (para ler, clique AQUI). Bem, em resumo, não tem origem conhecida, e me arrisco a dizer que foi criada somente como um contraponto ao 08 de março, Dia Internacional da Mulher, além daquele apelo comercial básico que essas datas tentam provocar (eu soube através de uma perfumaria, então...). A diferença é que o Dia da Mulher tem uma origem histórica bastante clara: pra quem ainda não sabe, esta data comemorativa relembra os primeiros protestos em que mulheres se envolveram, no início do século passado, em busca de melhores condições de trabalho, completamente abusivas e insalubres à época. Entra em consonância com o movimento feminista, e na verdade o que tomamos como "comemorativo" é mais uma lembrança diária de como as mulheres ainda se veem em desvantagem, pois se para sobreviver um homem precisa matar um leão por dia, é comum que elas matem dois e ainda guardem a carne pra dar de comer aos filhos!

Não quero discutir a redefinição de papéis dos gêneros em nossa sociedade, mas reafirmar que ainda hoje é difícil assumir-se mulher. Não à toa, chamar um homem de "mulherzinha" soa ofensivo aos ouvidos de muita gente... E os homens gays, os efeminados, os que querem se portar como uma varoa? Ser um homem que demonstra de forma mais aparente o que o meio social aceita como feminino é rebaixar-se perante os outros. E em cima disso justificam as chacotas, as agressões, o persistente "racismo" e até mortes... Pra quem é LGBT e ainda não se tocou que o machismo é o principal detrator de nossa dignidade, é bom ficar ligado nisso também.

Enfim, como disse John Lennon:

"A mulher é o negro do mundo. A mulher é a escrava dos escravos. Se ela tenta ser livre, tu dizes que ela não te ama. Se ela pensa, tu dizes que ela quer ser homem."

Ok, me detive sobre as mulheres, mas agora falarei sobre os homens, já que hoje, dia 15/07, é nosso dia. Ser homem não é ser valente, agressivo, inteligente e sexualmente lascivo. Qualquer um(a) pode ser valente, agressivo, inteligente e sexualmente lascivo. Ser homem, na verdade, está cada vez mais atrelado a se encontrar no meio de uma encruzilhada, na qual é preciso escolher entre seguir o caminho dos esteriótipos, ou procurar compreensão sobre eles. Se fosse levar ao pé da letra a expressão "homem de verdade", diria que eles são, na minha opinião, os que procuram conhecer a si mesmos, tendo a coragem de ser frágil e emocional sem que a seus olhos isso pareça desonroso. A desonra está mais em como você trata as pessoas, não tanto em como você vê a si mesmo.

E para concluir meu "post comemorativo", deixo a tradução tosquinha que fiz pro ToriBr de um dos melhores covers já feitos por Tori: é a canção Real Men, do Joe Jackson! Pois eu ainda me pergunto: quem são os homens de verdade?

Real Men (Homens De Verdade)

Tome suas ideias de volta – Eu não sei quando
Foi a vez em que pareceu
Sempre
Ser só entre “nós” e “eles”
Garotas que se vestiram de rosa
Garotos que se vestiram de azul
Garotos que sempre se tornavam melhores homens
Que eu e você

O que é ser um homem hoje? – O que significa ser assim?
Ele é rude ou é bruto?
Cultural e limpo?
Agora está tudo mudado – E tem de mudar mais
Achamos que está melhorando,
Mas ninguém tem real certeza disso...

E então vai – E volta, outra vez
Mas agora nos perguntamos quem são os homens de verdade

Veja aqueles garotos simpáticos – Dançando aos pares
Brincos dourados, pele bronzeada,
Topetes¹ nos cabelos
Com certeza todos são direitos – Retos como uma fila
Todos eles são machos,
Veja o brilho de seus couros...

Você não quer soar estúpido – Não quer ofender
Então não me chame de bicha,
A menos que seja um amigo
Então se você for alto, bonito e bem forte,
Você pode usar o uniforme, enquanto eu sigo tocando...

E então vai – E volta, outra vez
Mas agora nos perguntamos quem são os homens de verdade

Tempo de se assustar – Tempo de mudar o plano
Se não souber como tratar uma dama,
Não sabe como ser um homem
Tempo de admitir – O que você chama de “derrota”
Pois há mulheres logo atrás de você, agora
E você só arrasta seus pés

Um homem produz uma arma – Um homem vai a guerra
Um homem mata, bebe,
E pode ainda sair com uma prostituta
Mate todos de preto – E os de vermelho também
Se houver guerra entre os sexos,
Logo não sobrará ninguém para contar história...

E então vai – E volta, outra vez
Mas agora nos perguntamos quem são os homens de verdade
E então vai – E volta, outra vez
Mas agora nos perguntamos quem são os homens de verdade...
E então vai – E volta, outra vez
Mas agora nos perguntamos quem são os homens de verdade


quarta-feira, 11 de julho de 2012

Samsara

Viver não é uma tarefa simples, especialmente quando sua fé pela vida é ferida. Mas a ferida não sangra sozinha... E por isso estamos todos juntos, na mesma tarefa complicada que é o dia a dia. Talvez lembrar disso sirva de consolo, pois como canta Shirley Manson em Big Bright World, "Rage against the dying light... I’m with you, I’m with you... I’m with you".

“Às sós, ninguém está sozinho”

Você me pergunta se o mundo é grande o bastante
Para suportar os instantes em que somos pesados,
Pesados como as pedras que resguardam o submundo
Pergunta-me se a gravidade é suficiente para nos segurar,
Quando nos sentimos tal qual uma pluma,
Aleatória pelo ar, mesmo que por poucos segundos
Insiste em saber se nossa morte é válida depois da vida
E se há saída, se é mais de uma a chance de existir saída
Acaba escrevendo na pele a fadigada rotina de perguntar
E duvidar
E se cansar,
Mas não parar
De questionar
E perguntar
E duvidar,
Até de si,
Para salvar

Salvar as poucas chances que existem nesse lugar
As mínimas chances que temos de fazer-nos grandes,
Grandes o bastante para neste imenso mundo encontramos
Um lar
Um lar que nos ofereça descanso
Depois de tanto duvidar

Deambular




"I'm with you"

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Tradução: "Muito Velha Para o Pop"

Por indicação do Rodrigo, li um texto muito interessante sobre ageism, o preconceito voltado para pessoas mais velhas. Ele parte do exemplo de Madonna, que trouxe de novo o assunto à mídia desde que lançou o MDNA e mostrou seus mamilos por aí, rs, e começa a discutir em como seria mais natural que a experiência de vida agregasse força a um discurso, invés de dissolvê-lo, como se não tivesse real valor.

O autor do texto não deve ser muito fã da Gaga, a julgar pelo nome do blog (Paws Down Lil' Monsters), mas suas palavras são interessantes, especialmente ao falar da imaturidade com que certos temas são tratados por ela e outros artistas mais novos. Reitero porém que considero o discurso de Gaga válido, e que sua força talvez venha exatamente da identificação que parte da juventude sente com ela... De qualquer forma, é melhor deixar que as palavras do autor falem por si. Para ler o original é só clicar AQUI.


"MUITO VELHA PARA O POP"

“Muito velha para o pop”. Posso dizer isso para tudo na vida. Substitua “pop” por qualquer outra palavra no dicionário, e ninguém se importaria. Vivemos numa sociedade que ecoa a ideia de que as pessoas perdem sua liberdade para fazer o que quiserem à medida que envelhecem, especialmente mulheres. Mas nós queremos realmente perpetuar esta ideia?

Depois de uma certa idade, mulheres não podem usar biquinis - elas são muito velhas para isso (não importa o quão boa é sua aparência, TEM de cobrir seus corpos). Depois de uma certa idade, mulheres não podem mais querer sair e ter diversão - elas são muito velhas para isso. Mulheres são encorajadas a largar seus empregos e permanecerem em casa cuidando do lar, parceiros e crianças. Aquelas que não fazem isso são as loucas.

E ninguém é mais louca que Madonna. De acordo com o que nos diz a mídia, ela é muito velha para fazer o que faz: passou da idade para as roupas que usa no palco, para mostrar seu corpo (ainda que ela esteja numa forma melhor que muitas garotas de 20 anos), é velha demais para namorar homens mais novos... A lista não termina.

As limitações que tentamos impor aos outros baseados em sua idade e gênero vão além de termos concretos (corpo, roupas, cabelo). Tentamos limitar a habilidade das pessoas em PENSAR de uma determinada forma, também: Madonna é muito velha para a música pop (um gênero musical), muito velha para cantar músicas sobre se divertir (deveria ela cantar sobre aposentadoria?), ela é muito velha para se chamar de garota.

Desde quando música pop, se divertir, e chamar a si mesma de “garota” tem um limite etário? Penso que lógica seria importante neste assunto:

Quanto mais velho você fica, mais experiência você ganha, e quanto mais você sabe, mais respeitado você deveria ser por cantar, falar e escrever sobre as coisas que passou, em geral - desde o trivial até as coisas importantes na vida. Mas não, invés de reconhecer e aceitar esta noção, tentamos impor o oposto: quanto mais velho você fica, menor é seu direito de falar sobre a vida. Então, e o contrário, quando se é muito jovem para certos tópicos?

Se uma mulher de 50 anos não tem permissão de tratar a si própria como “garota”, ou cantar sobre querer “se divertir”, fazer algo trivial, livre de dramas e até pateta para sua idade, porque levamos a sério um adolescente ou até pessoas com pouco mais de 20 anos quando cantam sobre coisas sérias, coisas estas que só uma pessoa experiente deveria estar cantando?

Às vezes, as pessoas são MUITO JOVENS PARA CERTOS TÓPICOS. Condenamos mulheres com experiência por cantar sobre a vida em geral, mas louvamos adolescentes e aqueles com seus 20 e poucos anos (que não tiveram realmente experiência na vida) por cantar sobre assuntos “sérios”. E o pior, nós os levamos a sério.

Não soa ridículo quando um adolescente canta sobre amor de verdade? O que adolescentes sabem sobre amor de verdade? Eles deveriam estar cantando sobre ter lição de casa e ficar apaixonado por alguém - essas coisas pertencem a seu universo - não amor de verdade. Lady Gaga cantando sobre imigração? De novo, qual a experiência dela com isso? Oh, nenhuma! Mas tudo bem. Ela tem passe livre porque está em seus 20 anos - esses “jovens” podem cantar sobre tudo, desde o frívolo “se embebedar e sair dançando”, até coisas sérias - mesmo quando são muito jovens para realmente entender sobre o que estão falando.

De acordo com as mesmas “restrições de idade” que a mídia usa sobre mulheres mais velhas nas artes, Lady Gaga (entre outras estrelas “jovens”) deveriam estar dedicando suas canções a coisas que pertençam ao universo dela: sair pra boates, se embebdar, dançar. Gaga faz isso com frequência. Mas ela também tenta abraçar “causas sérias” que estão completamente fora de sua alcunha:

Temas Gay, igualdade, imigração - ela não tem experiência de vida suficiente para falar sobre isso no tom que fala. Gaga pode abraçar a causa e cantar sobre ela, mas o tom usado por ela acaba mais sendo ilusório. Ela disse, recentemente: “estamos num mundo diferente agora. 25 anos atrás, gays tinham de se esconder”. Exatamente! Ela tem 26 anos. Ela não tem ideia sobre como realmente era a vida dos gays há 25 anos atrás.

Ficamos felizes por ela querer ajudar a causa gay. Mas por que não deixar claro que seu discurso de primeira pessoa é uma atuação? Sua idade e sua fala em como “estamos num mundo diferente agora” são a evidência de quão pouca experiência ela realmente tem em assuntos que clama serem dela. Invés de dar um apoio transparente à causa, ela atua como alguém que sofreu da mesma forma que aqueles há 25 anos atrás. Mas a mídia nunca sugeriria que ela é nova demais para saber de tempos passados com tanta propriedade.... Mesmo quando seu próprio discurso faz seu ato ser contraditório.

Homens também sofrem com o preconceito por sua idade. Mas em nada se aproxima ao sofrido por mulheres. Mick Jagger ainda usa hot pants, e dança como quando era um sex symbol, em seus 20 anos. Ninguém diria que ele é muito velho pra isso. Bruce Springsteen ainda usa calças apertadas. Ninguém diz que ele está muito velho para isso. Prince ainda usa seus figurinos espalhafatosos. Mais uma vez, ninguém o considera velho demais para isso. John Bon Jovi continua cantando sem camisa no palco. Ninguém diz que ela está muito velho para isso. De fato, pessoas até preferem que ele se mantenha como era nos anos 80.

O problema não diz respeito somente à mídia espalhando essas visões e regras retrógradas. O problema real está em nós mesmos, as pessoas que ecoam tais ideias no dia-a-dia.

Agora, por qualquer razão, little monsters dizem que Madonna está “velha demais para fazer o que faz”. Mas Ei, Gaga terá 30 anos em 4 anos. Ela então será velha demais para usar figurinos de Halloween diariamente.

Este é o perigo de espalhar e compartilhar ignorância com o mundo - tudo isso volta para morder seu bumbum! Perpetuar essas ideias retrógradas no momento presente só afetará a percepção que teremos de seus favoritos num futuro próximo... Afinal, não passaremos por um completo despertar cultural em somente 4 anos.